SOBRE 1964.

Ditadura ou democracia? Golpe ou revolução?
Os militares não admitem que tivemos aqui uma ditadura, como a de Pinochet. Alguns entendem que era uma guerra, e que situações extremas exigem medidas extremas. Outros, defendem que estabelecer um regime militar foi a única forma de evitar que nos transformássemos em um país com um modelo igual àquele adotado por Cuba. 
Durante anos, fomos obrigados a dizer que houve uma revolução, nos moldes da Revolução Francesa ou da Revolução norte-americana, que libertou a colônia do domínio inglês. Pura falácia, uma vez que não há como estabelecer comparação entre esses momentos históricos tão díspares quanto distantes no tempo. 
Esse tema nunca poderá ser discutido com base nas paixões que nos assolam. Fui criança e fui adolescente, ingressei na fase adulta durante o regime militar. As impressões que guardo daquele período são antagônicas. Coisas boas aconteceram, mas foram historicamente ofuscadas pela violência cometida nos porões da ditadura. O número de feminicídios era tão grande? Obviamente, não. Mas a mulher ocupava um espaço insignificante na sociedade brasileira, não ocupava o espaço que luta tanto para ocupar, na sociedade brasileira contemporânea.
A criminalidade era tão violenta, a ponto de dominar o país, como faz hoje o chamado crime organizado, que exerce o poder paralelo, de dentro dos presídios? Não. 
As liberdades individuais eram respeitadas? Não, mas a corrupção não era tão escancarada, a educação, a saúde e a segurança pública não haviam sido destruídas totalmente (mas o processo já se iniciara, obviamente, bem antes do regime militar).
Não podemos esquecer que muitos políticos bandidos, corruptos, sem caráter, apoiaram o regime militar, mas já eram bandidos, corruptos e sem caráter, antes do regime militar, e continuaram a ser depois dele, e muitos estão aí até hoje, obtendo o voto, inclusive, de quem se diz contra o regime militar. Nada mais ridículo do que defender uma coisa a nível nacional e votar no seu bandido de estimação, a nível estadual e municipal. Muitas vezes, vi pessoas se posicionando contra o atual governo, e apoiando pessoas que se encontram do mesmo lado. Vi pessoas dizendo que jamais votariam no PT, pois não eram de esquerda, mas, no seu município ou no seu estado, votam no candidato do PT, em troca de cargos ou favores. 
Assim, da mesma forma, vemos aqueles que detonam o regime militar, ao mesmo tempo em que sempre deram o seu voto a políticos que apoiavam abertamente a ditadura. 
 Um governo repressor impõe o medo em muitas esferas. Em nome de uma suposta normalidade, legalidade ou outro argumento qualquer, suprime as liberdades individuais, pratica atos cruéis, mas nunca devemos esquecer que muitos grupos que deram apoio a movimentos dessa natureza, hoje, em nome do politicamente correto, cospem no prato que comeram. 
O brasileiro não tem consciência política. Não sabe votar. Troca o voto por cargo ou por cesta básica, ou por qualquer coisa que lhe seja oferecida. A maioria do nosso povo, é assim, ignorante politicamente. E isso nada tem a ver com títulos ou com analfabetismo: tem a ver com outros aspectos, que não estão diretamente relacionados ao grau de instrução. 
Acho que nada justifica a tortura, a morte de inocentes, a ausência do devido processo legal, a destruição moral de um povo. Mas uma coisa precisa ser dita, e sei que alguns podem até me odiar depois disso, mas estou apenas exprimindo a minha opinião: existe uma classe que colocou os militares no poder. Depois, conspirou para a queda do regime militar, e conseguiu. Posteriormente, apoiou a Nova República, o Governo Collor, o Governo FHC, o Governo Lula (inclusive com o VIce-Presidente eleito juntamente com Lula sendo um membro dessa classe) , elegeu Dilma, derrubou Dilma, apoiou Temer e elegeu Bolsonaro. É o mesmo grupo. E dependerá apenas dessas pessoas, se o atual governo permanecerá, cairá, se reelegerá. Resumindo: são os mesmos grupos, as mesmas pessoas. 
Essa classe, a burguesia, detentora da riqueza desse país, é quem manda, realmente. Não de forma aberta, mas colocando no poder quem melhor atender aos seus interesses. Não existe luta de classes, em países subdesenvolvidos como o nosso, de décimo mundo. Existe apenas uma classe, que estabelece todas as regras do jogo político, sem freios, sem limites, derrubando quem a ela se opuser. 
Essa classe esteve ao lado de Lula, quase da mesma forma como hoje está ao lado de Bolsonaro. Puro oportunismo.
E as pessoas ficam brigando, e deixando de perceber como as coisas realmente são. 
Foi essa classe que pediu os militares no poder. Juntamente com agremiações religiosas, dentre outros grupos. Os militares assumiram o poder sem disparar um tiro. E os mesmos grupos que exultaram, comemoraram, demonstraram felicidade por estarem livrando o país do comunismo, quando lhes foi oportuno, se posicionaram contra a tortura, mesmo tendo feito vista grossa. 
Mas isso somente acontece em um país de ignorantes, de pessoas que não conhecem a própria história. E um povo que não conhece a própria história não merece respeito. E não será respeitado por nenhum governante que foi eleito, exatamente, em decorrência dessa ignorância.

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